quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Competentes e privilegiados

















Discutir fórmulas de disputa futebolística pelos méritos ideais dos sistemas é exercício interminável de subjetividade. Não existem modelos mais “justos” que outros, pois cada critério pede aptidões distintas. Podemos preferir disputas que exigem prudência e regularidade, ou as que favorecem o ímpeto e a surpresa, mas todas guardam lógicas defensáveis segundo os ambientes competitivos a que se destinam.

O debate começa a ficar menos relativo quando chegamos a um nível conjuntural e prático, ou seja, às condições materiais que acompanham as fórmulas classificatórias adotadas. Ora, é evidente que os possíveis benefícios dos pontos corridos só existem quando os adversários compartilham situações financeiras minimamente equilibradas. O privilégio econômico destrói a natureza igualitária do sistema e permite à rede Globo e a seus patrocinadores, através da escandalosa distribuição desigual das verbas televisivas, manipularem os resultados finais dos Campeonatos Brasileiros. Todo ano, invariavelmente, as oito melhores posições são ocupadas por clubes que arrecadam mais. E sempre será assim enquanto imperar essa cômoda “justiça” de mão única.

A festejada “competência” do Fluminense deve ser entendida apenas pela superação de outros clubes que possuíam os mesmos benefícios. Tomada como valor absoluto, a ideia distorce a realidade e fornece pretextos para que julguemos os meios de acordo com os fins alcançados. Burlar regras e pressionar juízes, por exemplo, também seriam sinônimos de “competência”, desde que levassem a vitórias impunes.

Não se trata de questionar a legalidade do título tricolor (não pelo aspecto em pauta), mas de lembrar que ele foi conquistado através de mecanismos exteriores ao domínio esportivo. Basta imaginar o clube sem três ou quatro de seus jogadores mais caros. A superioridade técnica de um corredor que vencesse adversários descalços não soaria razoável, mas no futebol regalias semelhantes parecem naturais.

A maioria dos admiradores dos pontos corridos se esforça para preservar as boas intenções do modelo, repudiando o favorecimento econômico da elite. Acontece que as duas coisas são indissociáveis. O método de pontos corridos é a fachada imparcial de um mecanismo corrompido que de outra maneira não teria a mesma eficácia (os sistemas eliminatórios estão sujeitos a contingências indesejáveis). Portanto, elogiar os pontos corridos implica necessariamente defender os interesses de uma rica minoria que se locupleta da decadência do futebol nacional.

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